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CNH em foco
O compadre fazia muita falta na fazenda, razão pela qual não teria tempo de fazer auto-escola e provas de habilitação
Sempre que vejo a polícia desmantelar sistemas de vendas de Carteiras Nacionais de Habilitação, envolvendo Detrans, Ciretrans, escolas e corregedorias – coisa que acontece várias vezes por ano –, me lembro de um sabão que tomei, por justa causa, lá se vão 40 anos. Tive um compadre na roça, até hoje bom amigo, que dirigia caminhão militar com extração, isto é, com tração nas seis rodas, porque tinha duas na frente e quatro no eixo traseiro. Ford canadense, caixa-seca, o que significa dizer que as marchas eram passadas de ouvido, no tempo, sem essa de sincronização. Além do caminhão, o compadre pilotava automóveis, picapes, tratores de rodas e de esteiras, motos e o mais que houvesse para dirigir nos caminhos internos da fazenda e nas estradas rurais, mas empacava na Rio-Bahia, onde havia um posto da Polícia Rodoviária a 500 metros, num entroncamento perigoso.

Na emergência, disseram-me que o Claudinho, ou Candinho, da auto-escola mais próxima, vendia carteiras quentes. Expliquei ao Candinho (ou Claudinho) que tinha um compadre, craque no volante, consciencioso, motorista supimpa, carecendo de carteira para dirigir na Rio-Bahia. Disse, ainda, que o compadre fazia muita falta na fazenda, razão pela qual não teria tempo de fazer auto-escola e provas de habilitação.

Levei do professor Candinho (ou Claudinho) um sabão em regra: “Eu não faço isto, não! Isto é um crime! O senhor imagina se a gente vende uma carteira para um cidadão, ele pega um carro, um caminhão, e mata uma porção de gente? Como é que a gente fica? Isto é um crime!”

Com a descompostura, fui ficando pequenininho, pequenininho, quase sumi na calçada, moralmente arrasado. Salvou-me o próprio Claudinho, ao concluir: “Mas como o senhor está dizendo que ele guia muito bem, a carteira custa 700. Só preciso do nome do rapaz e duas fotos 3x4. Depois ele assina.”

As economias do compadre somavam 350. Emprestei-lhe 350, tirou as fotos e recebeu a carteira em duas semanas, autorizado a dirigir automóvel, caminhão, ônibus, carreta, todo e qualquer veículo provido de motor, com exceção, talvez, de helicóptero e avião a jato.

Três ou quatro meses mais tarde, estourou novo escândalo de venda de carteiras. Passei na auto-escola para saber se o compadre estava incluído na lista. Claudinho (ou Candinho) foi admirável: “Diz para o rapaz ficar frio, que a carteira dele é das boas. Essas que eles pegaram são de gente que não fez curso, não fez prova, não sabe dirigir, porque o senhor sabe, doutor: são uns criminosos, vendem carteira para qualquer um.”

Propaganda na UTI

Meu amigo Haroldo, dono de cinco cemitérios, teve uma ziquizira precordial, botou três stents e saiu do hospital com garantia de fábrica e quilometragem sem limites. Dizem as más línguas que, nos cinco dias de UTI, o excelente patrício vivia perguntando às enfermeiras: “Quem é o piorzinho de hoje?”. Informado de que o bola da vez era fulano de tal, pedia à enfermeira que desse ao paciente terminal o seu cartão de visitas, junto com o fôlder colorido de propaganda de seus lindos cemitérios.

Os riscos do não-saber

Quando faço a louvação do meu não-saber, cês podem achar que é charminho bobo, quando é a mais pura verdade: minha ignorância é ampla, geral e irrestrita. Domingo, por exemplo, confundi Átila com Aníbal e fui massacrado pelos leitores mais miudamente enfronhados em assuntos históricos. Resumindo, parece que Aníbal Barca, general cartaginês, viveu antes de Cristo, ao passo que Átila, o rei dos Hunos, andou por aí entre 406-453 d.C. Dizem que um dos elefantes de Aníbal, na invasão da Itália, atendia pelo nome de Surus (o Sírio). Tenho amigos de Yabrud, na Síria. Vou consultá-los sobre o paquiderme, mas é provável que Surus fosse indiano. Só uma coisa é certa: ninguém deve acreditar piamente nas tolices que escrevo, salvo nos casos em que afirmo que presenciei a cena.

Moeda supimpa

A maior e mais cara moeda de ouro já fabricada está exposta em um museu da Áustria. A maple leaf canadense tem 45 centímetros de diâmetro, pesa 100 quilos e vale mais de 3 milhões de dólares. Infelizmente, não cabe nas cuecas de certos políticos.

O mundo é uma bola

11 de junho de 1184 a.C., data em que Tróia foi saqueada e incendiada, de acordo com os cálculos de Eratóstenes, que não dispunha, coitado, de uma calculadora eletrônica chinesa, destas que custam R$ 8. Matemático, astrônomo, geógrafo e poeta, Eratóstenes viveu entre 276 e 196 a.C. Nasceu em Cirene, atual Sahhãt, na Líbia. Cirene era o nome de uma ninfa. Bato, filho de Grino, rei da Ilha de Tera, para livrar-se da gagueira foi parar na África, mandado pelo oráculo de Delfos. Cirene, belíssima filha de Hispeu, rei da Tessália, foi raptada por Apolo e levada para o Monte Cira, na África. Ali viveu e teve quatro filhos, não sei se com Apolo ou com os tessálios enviados pelo pai à sua procura. Chegando Bato ao Monte Cira e reconhecendo o nome indicado pelo oráculo, fundou a cidade e lhe chamou Cirene. Eratóstenes nasceu lá e eu tive uma amiga chamada Cirene. Os créditos deste belo parágrafo são de Justino (Histórias Filípicas, XIII) e Antenor Nascentes.

Ruminanças

"Há pessoas que só vivem para encher de e-mails a caixa postal e a paciência de suas vítimas" (R. Manso Neto).
11 jun 2008 - Estado de MinasVoltar