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Multas em escala industrial
Quantidade de autuações aplicadas por agentes da BHTrans subiu mais de 50% em dois anos, período em que a empresa municipal começou a cobrar produtividade de seus funcionários
Fábio Fabrini e Thiago Herdy
Maria Tereza Correia//em/d.a press -24/5/04

A quantidade de multas aplicadas pelos fiscais da BHTrans cresceu 51% na era da produtividade. Desde que a empresa municipal começou a pressionar funcionários a punir motoristas em Belo Horizonte, inclusive com a elaboração de rankings com nomes dos “campeões da caneta”, as autuações dispararam. Os agentes emitiram 190,6 mil autos de infração em 2005, número que passou para 288,3 mil no ano passado. Nesse período, não houve concurso público para contratar mais profissionais, o que significa que cada um passou a multar bem mais, ajudando a turbinar a arrecadação. Em 2007, a receita obtida com os autos de infração de trânsito atingiu R$ 42,6 milhões.

A explosão da produtividade dos agentes está espelhada no gráfico fotografado ontem pelo Estado de Minas no quadro de avisos da entrada de uma das gerências da BHTrans (veja ao lado). O documento destaca que a média diária de multas per capita aplicadas por um grupo de agentes cresceu 2,5 vezes: variou de 10, em janeiro de 2005, para 25, em abril de 2008. A suposta política de incentivo à autuação foi denunciada ontem pelo EM, que teve acesso à lista que mostra o desempenho de fiscais das gerências de Ação Regional Barreiro e Oeste (Garbo). Os documentos eram periodicamente afixados em quadros de aviso internos da empresa e, segundo o sindicato da categoria (Sintappi-MG), ainda são usados para incentivar os profissionais a punir.

Dirigente do Sintappi e fiscal de trânsito, Alex Alves afirma que a pressão também é feita, de forma verbal, pelos chefes da fiscalização. Ele explica que as medidas foram adotadas a partir de janeiro de 2005, quando o engenheiro Marcos Fontoura assumiu a Diretoria de Ação Regional e Operação da BHTrans. Além dos rankings, não raro afixados ao lado de gráficos com a avaliação de cada agente, ele é apontado como o criador da “quarta-feira maluca”, dia em que, religiosamente, funcionários dos quadros internos, com curso de formação de agentes, vestiriam o uniforme de campo para participar de uma maratona de fiscalização nas ruas.

Também é ele, segundo fiscais, quem levantou uma polêmica bandeira: usar as 20 câmeras do Controle Inteligente de Tráfego (CIT), que atualmente servem apenas para monitorar o trânsito, para multar a distância. A prática é proibida pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran), pois não há previsão legal para ela. Mas a BHTrans já avisou que, caso o conselho não publique regulamentação específica, tocará o projeto mesmo assim.

O sindicalista Alex Alves critica o critério de avaliação dos agentes, batizado internamente de política de tolerância zero. “Os fiscais passaram a ser pressionados a multar e chamar o reboque a qualquer custo. O serviço só é considerado completo quando há multa, não vale orientar motoristas”, sustenta, ponderando que o trabalho da categoria é muito mais amplo: “Somos responsáveis por monitorar cruzamentos, desvios motivados por obras, congestionamentos e várias outras atividades que não resultam em autuações”.

DISPARADA Em sintonia com as denúncias, o gráfico flagrado pelo EM na entrada de uma das gerências da BHTrans mostra o aumento da produtividade dos agentes de fiscalização desde 2005. A média diária oscilou nos últimos anos, mas uma linha ascendente é observada a partir de junho de 2007, quando a média estava perto de 14 autos de infração emitidos diariamente, por agente. A média chega a 22 infrações em dezembro, cai para 20 no mês seguinte e volta a subir. Em abril, justamente o mês em que a gerenciadora do tráfego na capital admitiu ter iniciado uma política de aumento da produtividade, a média diária já alcançava 25 multas por fiscal.

A BHTrans não deu explicações, ontem, sobre o esquema de fiscalização. Mas marcou para hoje entrevista coletiva, em que a direção deve falar sobre o assunto. Questionada sobre a atuação de Marcos Fontoura, a empresa informou que suas políticas não são personalizadas. A respeito do crescimento do número de multas, alegou que a frota de Belo Horizonte aumentou muito nos últimos anos, o que dá margem à variação. Mas a tendência não é a mesma no caso dos radares, que flagram, eletronicamente, o excesso de velocidade.

Em 2005, eles aplicaram 200 mil autuações, número que caiu para 195,9 mil em 2007. A receita das penalidades, publicada no Diário Oficial do Município (DOM), banca praticamente toda a estrutura da empresa, como o pagamento de salários, energia de semáforos, locação de veículos e obras, entre outros. O valor aplicado em campanhas educativas, cujo objetivo é fazer com que, pela via da consciência, os motoristas não desrespeitem a lei de trânsito e sejam multados, é o menor.

Ao todo, a BHTrans gastou R$ 56,6 milhões em 2007. A implantação e a manutenção de sinalização consumiram R$ 12 milhões. A operação de tráfego e a fiscalização tiveram R$ 39,3 milhões. A educação ficou com R$ 5,3 milhões. Mesmo assim, 37% do montante foram parar nos cofres do Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset), do governo federal, que bloqueia a maior parte dos recursos.

Arte de Valf sobre foto de Beto Magalhães/EM/D.A Press
11 jun 2008 - Estado de MinasVoltar