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TRANSPORTE ESCOLAR
Na carroceria, feito carga
Crianças e adolescentes da zona rural de Fruta de Leite, no Norte de Minas, são levados para estudar em caminhões e caminhonetes, sem qualquer segurança
Luiz Ribeiro
Fotos: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press
Depois de longa caminhada, estudantes e trabalhadores se acomodam como podem, para viajar até a sede do município

O município de Fruta de Leite, de 6,45 mil habitantes, a 662 quilômetros de Belo Horizonte, no Norte de Minas, enfrenta elevadas taxas de pobreza e de analfabetismo e conta com um baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), de 0,586. A educação é a alternativa para mudar essa realidade. Mas, para chegar à escola, muitas crianças da zona rural precisam se expor ao perigo em cima de carrocerias de caminhões, percorrendo estradas mal conservadas e em terrenos acidentados. A irregularidade está sendo averiguada pelo Ministério Público.

Na comunidade de Mumbuca, o Estado de Minas acompanhou cerca de 20 crianças e adolescentes que saem de casa de madrugada e caminham 12 quilômetros, na escuridão, até subir na carroceria de um caminhão que os leva até a escola, na área urbana, onde freqüentam aulas dos ensinos fundamental e médio. O vereador Aeldivan Pedro Fonseca (PT) afirma que, em todo o município, pelo menos 100 estudantes são transportados nessas condições. Ele diz que, por várias vezes, os pais tentaram uma solução na prefeitura, mas não tiveram resposta. Por isso, recorreram ao Ministério Público, em Salinas, a 22 quilômetros de Fruta de Leite.

O promotor de Salinas Vinicius Alcântara Galvão informou ontem que, sexta-feira, depois de receber um abaixo-assinado dos moradores de Mumbuca, encaminhou uma notificação ao prefeito de Fruta de Leite, Marclênio Ferraz da Rocha (PR), dando cinco dias úteis para a solução do problema. “Se no fim desse prazo ele não pôr um ônibus ou outro veículo adequado para transportar os alunos, vou entrar com uma ação civil pública contra a prefeitura. A Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelecem que toda criança tem direito a estudar e o transporte escolar deve ser oferecido pela administração municipal com a devida segurança”, alerta Alcântara.

Aeldivan Fonseca afirma que há a suspeita de que os caminhões usados no transporte irregular de estudantes em Fruta de Leite pertençam a pessoas ligadas a vereadores da cidade que apóiam a administração municipal. “Existe essa desconfiança. O problema é que não sabemos como é feita a contratação do serviço, pois nunca tivemos conhecimento de quando ocorrem as licitações”, diz. Ele informa que a prefeitura usa ônibus no transporte escolar, mas a frota não atende todo o município. Diz ainda que alunos de pelo menos cinco regiões da zona rural de Fruta de Leite são conduzidos em cima de carrocerias de caminhões.

No início da semana passada o EM esteve na Prefeitura de Fruta de Leite e foi informado de que o prefeito Marclênio Ferraz da Rocha não estava e que somente ele poderia falar sobre o transporte escolar. Depois disso, ainda na semana passada, em vários telefonemas não foi possível ouvi-lo. Ontem, a prefeitura estava fechada, por causa das festas de São João, e o prefeito, viajando para a zona rural.

Embora tenha dito que não era autorizado a falar sobre o assunto, um assessor da prefeitura alegou que os alunos de algumas comunidades rurais são transportados em caminhonetes e caminhões porque as estradas, em más condições, não dão passagem aos ônibus. “O transporte nas carrocerias é a única forma de trazê-los à cidade para estudar”, disse. Um motorista de uma das caminhonetes usou o mesmo argumento: “Há estradas em que só passam veículo de tração”.

Até para subir é difícil e um funcionário da prefeitura alega que as estradas não comportam outro tipo de veículo

PRIORIDADE O promotor Vinicius Galvão diz que não recebeu nenhuma denúncia de que pessoas ligadas a vereadores em Fruta de Leite estariam sendo favorecidas na concessão do transporte escolar. “Mas, se recebermos a denúncia por escrito, vamos apurar”, informa. “Para nós, o mais urgente é resolver a situação dos alunos transportados de maneira irregular. Isso é prioritário. Depois, poderemos ver outras questões”, destaca, lembrando que o prefeito, ao responder a um questionamento sobre a irregularidade no transporte, argumentou que a denúncia não passa de invenção de adversários políticos.

Galvão acrescenta que em investigação desse tipo de denúncia o Ministério Público ouve todos os envolvidos, desde pais de alunos até o prefeito. A Secretaria de Estado de Educação informou que, neste ano, está previsto para o município de Fruta de Leite repasse de R$ 149.450, dinheiro destinado à manutenção e ao custeio do transporte escolar. São beneficiados 427 alunos da rede estadual de ensino na área rural e a contratação do serviço é feita pela prefeitura.
24 jun 2008 - Estado de MinasVoltar